sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Conta mais, Machado

Crônica publicada no Chocalho de Palavras, coluna minha no Cultura Plural. 



No calor do julgamento do mensalão, muita gente acredita que o cenário político é exclusivo. Não é a culpa das pessoas bombardeadas de noticias vindas da capital federal. A nossa realidade nacional tem mais que o voto dos relatores no STF, as verbas da Copa de 2014 amplamente discutidas, jogos do Brasileirão ou a final da última novela das oito. Não menosprezando os outros fatos, mas talvez um esquecimento coletivo seja a questão da leitura em nosso país, tão discutida nos ambientes escolares.
Por anos a escola, quando acordou lembrou da importância do verbo ler , começou a discursar sobre tal ato. O abismo entre a teoria e a prática sempre foi um problema crônico, principalmente nos pilares sociais – educação, saúde e segurança pública. Não é uma crônica eleitoreira, por mais que o segundo turno tenha há menos de vinte quatro horas encerrado os seus rumos (que as propostas vigorem para o aplauso e uso até mesmo de quem não contribuiu na eleição do eleito), mas é impossível não lembrar dos discursos sobre a leitura, como ela fosse responsável pela felicidade. Qualquer proposta de biblioteca e lá estão crianças e adultos com semblante de felicidade – é o estigma da poesia feliz aprendida nas séries iniciais.
Já que necessitamos da prática, da ação, de tudo aquilo que demonstre diferença dos parágrafos bem construídos em planos de governo, questiono parafraseando o professor de literatura, amigo e colega, João Amálio Ribas – se a leitura é tão falada e argumentada como fonte principal de aprendizado, felicidade e bons modos, por qual motivo a escola não destina um espaço para ela de acordo com o seus próprios pressupostos teóricos? A não resposta é um sinal de pensar o que os alunos estão tirando das leituras “obrigatórias” feitas nas escolas, como requisito de pretexto para desenvolvimento humano. O clássico quando trabalhado é julgado como algo ultrapassado por muitos professores, os alunos não tem a obrigatoriedade de saber mais que o educador, por isso, muitos deixam de ler, imaginando uma literatura morta nas tumbas do século XIX.
Quando chega a notícia que o STF vai julgar obras de Monteiro Lobato, alegando denúncias de racismo do autor impregnados em suas obras, fechamos a cortina, acendemos as luzes do palco e – se a literatura é uma ficção, pode ela ser julgada? Se autor e narrador não são a mesma pessoa, pode um ser julgado pela interferência do outro? Madame Bovary, sou eu, afirmou Flaubert, seria essa a maldição que assola muitas vezes autores e obras.
Longe do processo lobatiano, em um país em que a leitura é muito mais comentada que folheada, um conto como Negrinha do próprio Lobato, mostra que a literatura humaniza e não precisa de temas transversais, paradidatismo e perguntas sobre a editora do livro. 
Em tempos de “tons cinzas” entre os mais folheados e comprados no mundo, sei que a Shara, uma menina de quatro anos, adora escutar narrativas do Machado de Assis, desfaça tudo o que leu sobre literatura clássica nessa crônica e acredite: isso sim é uma auto ajuda verdadeira e está há tantos séculos na fala das pessoas – até mesmo de uma criança.



quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Estratégias



Crônica publicada originalmente no site Cultura Plural, coluna: Chocalho de Palavras, 06/12/2011.
Nunca sai de casa sem levar o guarda-chuva nos últimos vinte anos. E assim tem sido, se vejo pela vidraça da janela do escritório uma pequena nuvem aparentemente carregada, não tem jeito, pego este objeto incomodável para ser a amante de mãos dadas pela cidade. A chuva que ameaçava cair, cada pingo uma ópera para musicais hollywoodianos. E pelos outdoors a propaganda do motel com os sete, oito parcelamentos no cartão de crédito, provocando estranheza de alguns alunos na espera da condução que os leva de volta para casa depois de mais uma semana de cursinho pré-vestibular. Pensei, não que seja um erro, mas existe um paradoxo dividido pelo começo de uma avenida conhecida do centro da cidade. Quadras acima, descobri nesta mesma semana, que a primeira rodoviária da cidade é no local em que hoje funciona um dos jornais, os guichês de compra de passagens, ficavam no espaço em que encontramos parte do comércio – lanchonete, livraria e uma loja de malhas. Adiante, mais exato uma quadra acima, o primeiro cemitério.
A cultura histórica não li nas páginas ou em consultas na biblioteca municipal, por mais que muitas vezes a chave do conhecimento esteja decifrada pelo toque dos nossos dedos - livros, teclado do computador, é com a prosa e por ela que aprendemos. O cuidado com as historietas pode salvar um exilado com guarda-chuva nas mãos. “Proibido entrar com animais” – afirma a placa na entrada da farmácia, uma delas pelo menos tem isso na porta principal. Adiante, chocolates, bolachas doces, açucares variados. “Cuidado, açúcar”, slogan de um creme dental em promoção pague 2 e leve 3. A atendente pergunta se não vou levar chocolate hoje – meu riso deve ser traduzido por “é óbvio”.
Nos dias de instabilidade do veranico com os ponteiros no horário de verão,  não sabemos se o guarda-chuva é a melhor proteção que qualquer filtro solar, ou um dos recursos contra as pancadas de chuva que costumam acobertar a cidade. Uma fórmula infalível para não perder o rumo das andanças é adquirir hábitos de não sair em dias com cheiro de chuva. A minha avó sempre dizia isso, nunca entendi direito essas coisas. Mais fácil saber de signos, não pergunte o meu, pouco sei dele, e desconfio que as previsões estão todas mais preocupadas em saber de 2012.
Na segunda-feira; tempo bom. Terça; poucas nuvens. Quarta; ninguém sabe nada. Quinta; o dia começou com céu limpo. Sexta; cansado, ventos fortes. Sábado; últimos do ano. Domingo; comprar guarda-sol.
Estou sem tempo e fiz uma listinha semanal, enquanto o barulho dos carros na madrugada na mesma avenida dos outros causos, não é moda com sonoridade musical, mas algo comportamental. Depois, guarda-chuva sempre incomoda apenas quem o carrega.  Uma nuvem, quase 01:28, sábado. 

domingo, 13 de novembro de 2011

Três assuntos




Tinha a mania de não deixar os sapatos na porta da entrada. Acreditava que a mania não era nada mais que uma tradição familiar. No tapetinho com o dizer “bienvenido” laranja, pouco do pó vermelho da sola das sandálias permanecia.
Pela rodoviária da antiga capital do café, enganado pelo frio atípico do pseudo verão, bebia lentamente um café com pouco leite comprado na lanchonete do local. Não tome café em rodoviárias – era a sentença da sua mãe. Sem chances para lembrar dos conselhos, pediu também um pão frito – pouca margarina, pediu.
O jornal da semana passada, nada pode ser pior, notícias que já se tornaram baluartes das sabatinas disparadas por aí. Dessa vez o herói da invasão da USP ou o culpado pode vai depender de que lado você está. Em uma época em que tudo se dilui, admitir um posicionamento político é algo beirando uma piadola. Não vamos refutar o politicamente correto, nem questionar o tal humor inteligente feito no Brasil, mas ao presenciar a situação na invasão da reitoria da Universidade de São Paulo, uma das faixas chamava atenção: “ninguém está acima da lei, só os políticos corruptos do Brasil”.  A interpretação é um estado livre, por mais que conste na história de muitos homens o contrário disso.
Dois senhores tomando o seu café – um deles reclamando do sabor não ter mais a essência de outras décadas, enquanto o outro, culpando a falta da geada no inverno, quando sacas de café eram perdidas. Espectador, acabei desviando o foco do noticiário televisivo, prestando atenção na prosa dos dois homens.
Outro dia, a deriva em um ônibus cheio no trecho entre Londrina e Ponta Grossa, antes de chegar no primeiro dos muitos pedágios, vi que a reitoria da USP tinha sido retomada com intervenção da polícia. Nestes formatos enquadrados na tela de celulares toda notícia parece menor do que é.  Na margem da reportagem, a fala de um governador, dizendo sobre democracia.
Quando passou a chuva, inexplicavelmente o sinal da internet caiu. Sem conseguir sinal, nem ligar para avisar sobre a chegada na cidade consegui. Mais rápido que a mudança brusca do tempo, foi à tecnologia da operadora de celular.

Voltei na conversa dos dois senhores na rodoviária de Londrina – não precisamos de tempo, mas precisamos do agora para comparar com o passado. O vapor do café no copo de pingado e as notícias não atrasadas – a democracia do final de semana. 

[crônica escrita especialmente para a Coluna "Chacalho de Palavras", do site Cultura Plural] 


quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Dez anos depois



*crônica publicada originalmente no site Cultura Plural, coluna Chocalho de Palavras.


A explosão da internet tornou-se a maior vantagem do mundo (ou o contrário, pode ser), e, com os dez anos dos atentados do onze de setembro, fomos atacados novamente pela crise do tempo. Inevitável é não lembrar o que fazíamos naquela tarde de pseudoprimavera.  Pelo menos para mim foi através dos televisores mudos expostos nas vitrines – batendo os pés nos outros transeuntes não compreendíamos nada do que a ancora do plantão vespertino falava, bombardeados pelas imagens dignas de filmes spielbergianos. 
 Talvez o impacto do onze de setembro tenha refletido nas gerações acostumadas e colonizadas pelos filmes americanos de guerra, normalmente colocando os Estados Unidos como a suprema fortaleza, algo já visto nas brincadeiras de “forte apache” (em miniatura) no tapete sala com os indiozinhos em confronto com os cavaleiros americanos. Sem saber nada de geopolítica estávamos diante de questões históricas, que arremataram a inocência daquelas brincadeiras após o western Fort Apache (1948), de John Ford, anos depois.
Em uma época de pós, mesmo com algumas refutações teóricas sobre o conceito de pós-moderno, não há como negar: uma década depois dos atentados o mundo teve mudanças sistemáticas, principalmente nas ferramentas de informações pela internet. Em março deste ano, presenciamos praticamente ao vivo o tsunami que atingiu o Japão, devastando várias cidades. Certamente foi a primeira atrocidade que teve grande parte das lentes do mundo, três anos depois do episódio em Nova York foi a vez de Madrid, capital espanhola, sofrer com o terrorismo dentro dos vagões de metrôs.
 Porém, foi com a invasão do Iraque por tropas americanas e a deposição seguida do assassinato do ditador Saddam Hussein, que novamente trouxe o bombardeio de tudo aquilo iniciado naquela tarde de 2001, deixando a sensação do alcance da internet ter atingido o seu primeiro “boom” noticiando uma guerra.
 O grande exemplo ocorreu no começo de maio deste ano, quando o presidente americano Barack Obama anunciou a morte de Osama Bin Laden, durante uma operação no Paquistão. Identificado como o grande responsável pela queda das torres do World Trade Center, tornando-se o inimigo número um dos americanos e do restante do mundo. Como espectadores acostumados à totalidade dos fatos, não ter a certeza da morte do fundador da Al- Qaeda, nos joga no terreno das desconfianças surgidas com a internet.
 Dez anos depois, ainda é melhorar cantarolar: eu detesto George Bush desde a Guerra do Kwait, conforme Zeca Baleiro e Chico César. Se quiser deixar as coisas mais light: quero adoçar a minha sina, que viver tá muito diet.

domingo, 4 de setembro de 2011

Epitáfio



     [foto de Washington C Takeuchi - www.circulandoporcuritiba.com.br] 

Há trinta e um dias, o meu avô materno completava 87 anos, cercado de familiares, netos, bisnetos e alguns amigos. No dia seguinte, os mesmos velavam o seu corpo em uma capela do Cemitério do Abranches. A quantidade de horas entre o aniversário e a morte foi exatamente de um dia. Talvez o maior contraste da sua morte foi a disposição da vida que sempre o acompanhou. Não era do time dos assíduos idosos clientes dos consultórios médicos, costumava dizer que seu sangre bugre era o responsável pela vitalidade.

Aprendeu cedo a viver zelando pelos outros, aos oito anos, órfão de mãe precisava cuidar dos outros irmãos, obrigações para um primogênito. Ainda sem o buço preenchido  pelos fios grossos de barba começou a trabalhar nas lavouras de cana em Ipiranga, cidadezinha na região de Ponta Grossa. Casou-se e criou seus seis filhos e mais três sobrinhos. Funcionário da construção civil, usava as folgas do final de semana para reformar a casa pequena de madeira em um bairro da região norte de Curitiba. Com o tempo conseguiu terminar – prendado, usou os dotes de marceneiro e fez guardas roupas, camas, casinha de cachorro e a mesa da cozinha, que sempre julgou ser um lugar sagrado para o encontro da família, por mais que preferisse ver as pessoas juntas de longe. Isso se tornou uma espécie de identidade do meu avô paterno, que com aforismos populares deixou o seu legado para todos nós: meu carro é movido com feijão e cagou-se o PTB, são parte do conjunto imprescindível. A sua morte foi um choque principalmente para todos nós que enxergávamos ali a significação diferente dos dicionários para a eternidade.

Um dos segredos da vida é este, crescemos com a ideia de que não vamos perder as pessoas amadas, preferindo acreditar que a morte é algo distante. Isso desconcerta nós todos, entendível, afinal não estamos preparados para perdas, por mais que a natureza humana seja a única comprovadamente racional. Este pensamento somente ocorreu no momento em que o tumulo era fechado – paradoxo de quem sempre usou as mãos para concluir suas próprias obras.

Em tempos que a expectativa de vida das pessoas está futuramente associada para um milênio, conforme o biogerontologista inglês Audrey de Grey, talvez a morte na modernidade seja os meros descuidos diários. Aquilo que o poeta satírico romano Juvenal chamou de mens sana in corpore sanouma mente sã num corpo são, mostra que já no século I a essência da medicina ortomolecular estava na sátira latina. As etapas da vida tem narradores diferentes, que frequentemente estão apoiados nos causos e contos – passamos de ouvintes de uma narração em terceira pessoa para com o passar dos anos chegar a primeira pessoa, evocando igualmente a um casmurro o sentido da vida, que Segimundo indaga em uma prisão: Qué es la vida? Un frenesí. ¿Qué es la vida? Una ficción.

Longe de saber qual o sentido e a durabilidade da vida, mesmo quando a ciência moderna traz a tona do debate os mil anos que as pessoas podem viver, fazendo com que muitas pessoas pensem realmente qual o sentido de um milênio de vida para quem normalmente busca nas invenções o melhor de uma vida na infância, respostas que nenhum gene pode responder. Adão o personagem bíblico morreu com 930 anos, segundo textos históricos e bíblicos, nem ele mesmo conseguiu os mil anos, diria o meu avô.














segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Ficção ao vivo


A cidade lá embaixo da minha janela é gelada nesta sexta feira. Está certo, meteorologistas são previsíveis, mas desta vez, admito: eles acertaram, tempo frio com chuviscos que nem parecem o cenário da chuva forte iniciada há mais de 24 horas.
Carros apressados, a rotina do final de semana, não quer reprise, pensa em chegar em casa logo, futebol, não, isso é nas quartas, seu time é da primeira divisão, pensa em zoar o amigo com time rebaixado e os jogos na sexta.
Com a esposa ausente, ela trocou a noite ao seu lado para acompanhar a mãe em um supermercado 24 horas no outro extremo da cidade, amanhã alguns primos da sua tia se hospedam na casa da sua mãe – casamento de uma vizinha amiga dos tempos de dificuldade com a suspensão da poupança por um ex-presidente.
Aqui, não há nada, o silêncio dos apartamentos vizinhos é a sentença, não tem futebol, mas último capítulo da novela das nove. Ri no seu tempo de televisão se falava, novela das oito, está certo, vai ver que o tempo é diferente a cada geração.
Insatisfeito com a presença solo, pega o controle remoto e começa zapear pelos diversos canais, pagos graças algumas horas extras no trabalho o final de semana. Normalmente passa por diversos canais no menor tempo possível, aprendeu que passando de um para outro, descobre programas novos, que normalmente durante a semana com mais pessoas em casa não consegue.
Na propaganda de uma cerveja com seus atores todos felizes e jogando sinuca, tocando uma música dos seus tempos de bailinho adolescente, começa a se sentir diferente. Na verdade o riff da sua primeira música aprendida em uma guitarra para canhotos com cordas para destros é começo do fim. Talvez sua única saudade no horário nobre. Até aqui, quem matou a Norma?
Ponta Grossa, 21h36, 19/08/2011
publicado originalmente no Blog Repúblicas do Brasil em 19/08, às 21h56

domingo, 17 de julho de 2011

A verdade está dentro




Acordo cedo no domingo, prezo por não olhar o relógio de pulso, mas os latidos dos cachorros vizinhos alarmam que o dia apenas começa. Que os cães criados dentro dos limites dos muros são fontes de estranhezas, não há duvidas. Portanto quando os cães vira latas latem, apenas querem alertar qualquer coisa sem alguma pretensão, pois a rua exige essa indiferença, diferentemente dos nossos cães domésticos. Poderia começar pela estranheza que está aqui dentro, mas cercado pelas lembranças que vocês impregnam, este espaço mesmo sem vocês é a casa de vocês (perdoe a repetição, aqui ela se fez necessária).
Nesta manhã de 19° em pleno inverno curitibano, começo pela história de vocês, primeiramente um personagem ultrapassando o meio século de vida com alguma folga, enquanto a outra personagem abre a janela da casa dos vinte anos. A esta altura o táxi laranja já está estacionado no outro lado da cidade, diferente dos outros domingos, carregando pessoas e histórias, hoje ele está embaixo de uma árvore no outro extremo da cidade. Quantos contos e personagens, viagens, corridas não pagas, gorjetas de gente pobre – uma vida é pouco, nem com bandeira dois, é possível contar. Pois é, taxistas são o voyeur da realidade urbana, se não passa pelos bancos do carro, passam pelos olhos prestados a atenção nos outros sujeitos do trânsito. Lembro que quando pequeno acordava no meio da madrugada com você colocando o cobertor sobre as minhas finas pernas. Depois, quando eu fiquei um pouco maior, acordava no meio da noite preocupado se você já havia retornado do trabalho – caminhava até o quarto, vê-lo roncando era o meu passaporte para voltar aos sonhos.
Disseram certa vez que todo menino encontra o super herói nas telas do cinema, outros nos esportes, principalmente no futebol, olha que nas palavras de um cinéfilo e um inveterado amante do esporte que o Carlos Heitor Cony definiu em forma de religião:  Deixei de acreditar em Deus no dia em que vi o Brasil perder a Copa do Mundo no Maracanã”, meu super herói é você, sempre há de ser, nenhum roteiro de Posolini seria capaz de encontrar justificativa no amor que sinto por você.
Praticamente três semanas sem conversar com você, por estas inconveniências cotidianas, criei uma espécie de autoexilio, hoje, percebo o quanto autoritário e pedante foi querer distanciar presença, calando palavras – mas, hei, os sentimentos sempre foram verdadeiros, para eles, há amor, como sempre falamos um para o outro. Nas idas e vindas da sua pré-escola, tempos em que subíamos a Leonardo Cobbe de mãos dadas sem os olhares curiosos de terceiros. Para depois, quando andávamos abraçados na saída de algum lugar, as pessoas ousarem perguntar: são namorados. De certa forma eles estavam certos, nossa década de diferença reflete essas coisas, como eu levar você ao cinema para assistir o Nemo, saindo de lá com o capuz do moletom cheio de pipoca jogadas por crianças se divertindo mais com isso que com as histórias do Bruce, aquele tubarão com pose de machão e chorão.
Quando em quando, fiz parte de responsável por você, sendo uma vitima dentro de shows que eu não gostava, sempre deixando isso bem claro – mas sem o direito de reclamar, afinal, quem a fez ouvir o rock de cada dia, fui eu.
Aqui nesta casa sem vocês, não é fácil, o relógio marca o silêncio, os cachorros agora dormem, apenas eu continuo aqui. Se vocês são personagens, até podem acreditar que sejam, de certa forma, são mesmo, principalmente aqui.
Mas para mim vocês são os autores disso tudo resumido nesta crônica dominical, meu pai e minha irmã – Francisco Carlos Scuissiatto e Karine Scuissiatto, personagens do texto, pessoas que fazem parte do melhor da minha vida, aniversariando no mesmo dia.
O narrador está pelo texto, enquanto eu vou para o outro lado da cidade almoçar em um churrasco com eles. Ao lado das pessoas que são uma parte da minha vida, a outra está com a minha Priscila Schonberger, também aniversariante neste mesmo julho.