terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Aniversário ou “A idade do céu”



(a leitura pede audição da canção "A Idade do Céu", de Paulinho Moska)

Era uma manhã de janeiro. Naquela altura do dia o cheiro de batata e carne de galinha invadia os corredores do Hospital São Lucas em Curitiba. Pai, vô e vó estavam agoniados pela chegada do Bruno – dez e meia, nasceu com pouco mais de três quilos e meio e cinquenta e três centímetros. A obstetra disse que era um recém-nascido grande. Ser personagem de crônica é uma espécie de embarque em “De Volta para o Futuro”, não querendo ser repetitivo, mas toda história moderna começa na maternidade, passa pelos primeiros passos, assopra velinhas nos festejos infantis, chega aos oito anos e esbarra nas lembranças: o álbum de figurinhas de aviões não devolvido pela professora de português, a expulsão no campeonato metropolitano de futebol de salão por uma dividida brusca com um menino da outra quinta série.

O ostracismo da vida adulta criou uma progressão geométrica dos oito anos aos dias de hoje. Não é preciso recorrer aos versos de Aniversário do Álvaro de Campos ou Profundamente de Manuel Bandeira para perceber que a vida mudou, mas o percurso sempre foi o mesmo. Basta pegar as fotografias e escutar as histórias dos meus avôs, ver o quanto mudei, que aquele ideal de ser jogador de futebol hoje se faz nas possíveis ideias dos filhos que ainda vão chamar-me de pai.

Posso estar no dia da comemoração de mais um ano, mas ainda não sou entendido e nem pretendo me especializar em aniversários. Ainda mais depois que passei ser sagitário pela nova classificação do zodíaco. Arrisco dizer pelo fato de ser um autêntico teimoso – o capricórnio pode sair de mim, mas não sairei dele (perdoe, nunca procurei entender o sistema do zodíaco). Teimosia é algo que nasceu comigo no dia 18 de janeiro.



quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Sem lenço e documento está aqui


Muitas vezes certas declarações são inapropriadas para o momento, ainda mais quando acompanhadas pela primeira semana de um novo ano – justamente no período em que as férias ainda estão apegadas as festividades dos transtornos natalícios e tem tudo para retornarem ao normal somente na segunda-feira seguinte a quarta-feira de cinzas. Dessa vez, justamente na mesma semana em que a presidente Dilma assume o posto de maior representante no Brasil, motivos para comemorar, pois pela primeira vez, uma mulher governa o país e o assume com a sombra de popularidade do ex-presidente Lula, que muito bem fez a então candidata nos tempos de campanha eleitoral.

Agora, tão difícil deve ter sido para Dilma esse começo de mandato. Na sua posse, os holofotes estavam na senhora Temer, uma jovem que evocou nas plácidas de Brasília, ares de Carla Bruni, por mais que o seu esposo tenha admitido não existir relação alguma com a primeira dama francesa. Aliás, o grande para-raio em um primeiro momento no Palácio da Alvorada é o próprio vice-presidente, Michel Temer, representante direto nas articulações do PMDB para participar das reformulações do governo Dilma. Esse pinga fogo é natural, bastidores da política, coisas corriqueiras, que cedem espaços para o debate em torno dos nossos representantes lá em Brasília.

Porém, o motivo maior dessa crônica, não é colocar em cheque minha aura falida de deformado estudante de comunicação social, nos idos em que as discussões do diploma ainda eram apenas indícios. Brecht, já definia há tantos anos o “analfabeto político”, talvez, por isso, sinta-me envergonhado em raramente escrever sobre política, por mais que ela normalmente me considere um fantasma, ao lado de tantos outros milhões de brasileiros.

Os fatos pitorescos do debute da presidente Dilma não ficaram apenas nos olhares para a esposa do seu vice ou para o aceno do ex-presidente Lula na sacada do seu apartamento em São Bernardo do Campo.

Fatos mesmos, mas com aspectos de fardos/fardas, vieram pela declaração do chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência, General José Elito Siqueira, que é contra a comissão de verdade. Mesmo parecendo contraditório, um homem trabalhando para o governo de uma presidente, que foi uma das torturadas pela ditadura no país, ser contra essa abertura, talvez, mudanças no tempo. O general começou com o pé esquerdo sua estada no governo, ao pronunciar: desaparecidos políticos são um fato histórico do qual nós não temos que nos envergonhar ou vangloriar.

Essa postura do general parece evidenciar uma coisa: as lapelas e os pensamentos pós 64 ainda estão em voga no Brasil de hoje. Realmente não precisamos nos envergonhar dos porões da ditadura, AI-4, AI-5 e todos os desaparecidos políticos entre 64 e 85. Quem sabe, as décadas de chumbo no país, são apenas argumentos para cineastas levaram para o cinema com o selo da Globo Filmes.

Passados tantos anos, como podemos deixar passar em branco os desaparecidos políticos do país? Será que tudo é normal ou apagado pelo tempo. Com certeza não, basta pensar, Brasil, que és, se não, filhos que não fogem da luta.

Na primeira semana do ano, começamos pensando em como é complicada essas noticias históricas, que chegam com poucas palavras e tendem desaparecer perante as férias e ao reality show mais famoso do Brasil. Pensando bem, os arquivos das memórias e livros de Élio Gaspari e Zuenir Ventura, entre outros, dizem sempre mais do que acostumados estamos. O ano, apenas começa.


[tira de Henfil]