Uns dos desdobramentos mais comuns na vida de uma pessoa em constante mudança são os vizinhos. Diferente de viver sempre em um mesmo endereço ou uma mesma cidade em que as mudanças ocorrem normalmente pelas transformações imobiliárias.
A explicação mais usual para o contato ou ainda a falta de contato com os vizinhos estabelece um conceito que torna o homem diferente de todos – sem eles não teríamos muitas boas histórias para contar.
O sorridente porteiro de um edifício no centro da cidade conseguia contar boas histórias sobre os moradores dos sessenta e cinco apartamentos – antes exercitava a especulação cotidiana com os moradores. Poucos minutos diários na espera do elevador eram suficientes para conhecer um pouco dos vizinhos, mesmo aqueles que nunca tinha visto.
No começo domiciliar na cidade não tinha dimensão de como ela funciona. Realmente é como dizem os professores de língua estrangeira, nada melhor que residir em um país para conhecer seu idioma, costumes e sentir na nuca o peso da cidade – no meu caso, um vento princesino. Nesta lógica, aprendi a conhecer a cidade, junto com seus sobrenomes tradicionais, não somente no campo da política.
Tudo uma casualidade, se visto pelas diferenças culturais existentes, mas para quem se acostumou a viver como um nômade, não pode ser estranho, nem mesmo notável tais acontecimentos. A grande chave para quem mora sozinho em uma cidade diferente da sua é a audição capaz de decifrar os menores ruídos.
Pode ser o disparo de um alarme de algum carro estacionado em vaga reservada para cadeirantes na mesma avenida com uma escuridão decorrente da queima de uma lâmpada bem no centro da cidade – justamente nos 20 metros acima a luz ajuda no brilho do luminoso da prefeitura que anuncia a população da troca de todas as lâmpadas.
Mas poucas coisas podem ser mais ficcionais que morar sozinho e não ter vizinhos de longa data. Aliás, tal teoria é ainda mais presente com uma edição de folhas tipo às de jornais do Cortiço de Aluízio de Azevedo. Anotações com pouco mais de um ano, que chegam pedindo passagem para a falta proporcionada do agora. Aos lados os dois vizinhos, contribuem para qualquer naturalista ficar inicialmente com vergonha – a timidez é um estado inerente do ser humano, principalmente quando sabemos o que acontece ao lado. Eles conseguem ao mesmo tempo sincronizar ações, poderia pensar que são conhecidos e realizam uma espécie de tara sexual, com um espaço entre eles – mesmo com um dos apartamentos sendo habitado recentemente.
Entre o contato com a lembrança do primeiro vizinho na infância, um sapateiro que costumava não entregar as bolas de futebol dos meninos exalando a infância no golzinho de toda tarde – e os vizinhos inusitados em São Paulo, como a senhora portuguesa que sempre morou sozinha depois que chegou de Porto. Escutei isso por diversas vezes no elevador entre o 6º e o 9º andar, sempre entre dois travestis que moravam juntas e reclamavam que a velha lusitana costumava bater com o cabo da vassoura no teto do apartamento para alertar sobre os risos de boas companhias naquele 112. A grande chave deste encadeamento é de nunca ter cruzado com a senhora nos mais de 13 meses residindo ali na região da Augusta, tendo sempre que escutar conversas em terceira pessoa.
A última mudança na cidade não permite mais eu encontrar o porteiro que sempre comentava sobre os moradores do edifício – por mais que sempre passe em frente ao local, o perceba sentado em frente ao um computador, sem ângulo para olhar o meu itinerário. Pensando bem, certo ele que comenta sobre todos os outros. Não será surpresa alguma encontrar no twitter uma hashtag # Marieta.
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