[foto de Washington C Takeuchi - www.circulandoporcuritiba.com.br]
Há trinta e um dias, o meu avô
materno completava 87 anos, cercado de familiares, netos, bisnetos e alguns
amigos. No dia seguinte, os mesmos velavam o seu corpo em uma capela do Cemitério
do Abranches. A quantidade de horas entre o aniversário e a morte foi
exatamente de um dia. Talvez o maior contraste da sua morte foi a disposição da vida que sempre o acompanhou. Não era do time dos assíduos idosos clientes dos consultórios médicos, costumava dizer que seu sangre bugre era o
responsável pela vitalidade.
Aprendeu cedo a viver zelando
pelos outros, aos oito anos, órfão de mãe precisava cuidar dos outros irmãos,
obrigações para um primogênito. Ainda sem o buço preenchido pelos fios grossos de barba começou a
trabalhar nas lavouras de cana em Ipiranga, cidadezinha na região de Ponta
Grossa. Casou-se e criou seus seis filhos e mais três sobrinhos. Funcionário da
construção civil, usava as folgas do final de semana para reformar a casa
pequena de madeira em um bairro da região norte de Curitiba. Com o tempo
conseguiu terminar – prendado, usou os dotes de marceneiro e fez guardas roupas, camas, casinha de cachorro e a mesa da cozinha, que sempre julgou ser um lugar sagrado para o encontro da
família, por mais que preferisse ver as pessoas juntas de longe. Isso se tornou
uma espécie de identidade do meu avô paterno, que com aforismos populares
deixou o seu legado para todos nós: meu
carro é movido com feijão e cagou-se o
PTB, são parte do conjunto imprescindível. A sua morte foi um choque
principalmente para todos nós que enxergávamos ali a significação diferente dos
dicionários para a eternidade.
Um dos segredos da vida é este,
crescemos com a ideia de que não vamos perder as pessoas amadas, preferindo acreditar
que a morte é algo distante. Isso desconcerta nós todos, entendível, afinal não
estamos preparados para perdas, por mais que a natureza humana seja a única
comprovadamente racional. Este pensamento somente ocorreu no momento em que o
tumulo era fechado – paradoxo de quem sempre usou as mãos para concluir suas próprias
obras.
Em tempos que a expectativa de
vida das pessoas está futuramente associada para um milênio, conforme o biogerontologista
inglês Audrey de Grey, talvez a morte na modernidade seja os meros descuidos diários.
Aquilo que o poeta satírico romano Juvenal chamou de mens sana in corpore sano – uma
mente sã num corpo são, mostra que já no século I a essência da medicina
ortomolecular estava na sátira latina. As etapas da vida tem narradores
diferentes, que frequentemente estão apoiados nos causos e contos – passamos de
ouvintes de uma narração em terceira pessoa para com o passar dos anos chegar a
primeira pessoa, evocando igualmente a um casmurro o sentido da vida, que Segimundo
indaga em uma prisão: Qué es la vida? Un frenesí. ¿Qué es la
vida? Una ficción.
Longe
de saber qual o sentido e a durabilidade da vida, mesmo quando a ciência
moderna traz a tona do debate os mil anos que as pessoas podem viver, fazendo
com que muitas pessoas pensem realmente qual o sentido de um milênio de vida
para quem normalmente busca nas invenções o melhor de uma vida na infância, respostas
que nenhum gene pode responder. Adão o personagem bíblico morreu com 930 anos,
segundo textos históricos e bíblicos, nem ele mesmo conseguiu os mil anos,
diria o meu avô.
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